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10 de dezembro de 2009

RELIGIÕES UNIVERSAIS

As religiões apresentadas até agora não saíram das regiões em que foram criadas. Mesmo o taoísmo e o hinduísmo, que têm interesses e valores que ultrapassam as limitações geográficas e étnico-políticas por suas mensagens e preocupações que não se limitam a um Estado e a um povo, não tiveram e não têm um impulso que os levassem além das fronteiras da China e da Índia. O hinduísmo, a bem da verdade, conhece um movimento de ‘renascimento’, começado no fim do século XVIII, depois do impacto provocado pela colonização ocidental. No século passado e no atual, grandes personalidades se debruçaram sobre as tradições e obras sagradas hindus, realizando uma purificação das práticas religiosas e, concomitantemente, enfocando os grandes problemas humanos e sociais da Índia. Entre estas personalidades, está o Mahatma (= grande alma) Gandhi (1869-1948) que na Índia é considerado, mais do que líder político, um grande mestre espiritual. A Ahimsã (não violência) que ele pregava era, na sua intuição, não tanto instrumento de reivindicação política, quanto a estrada mestra para alcançar a Verdade (Satya) de Deus e para se deixar levar por ela. Hoje em dia, o hinduísmo adquiriu um impulso missionário e podemos encontrar até em nossas cidades os jovens do Hare Khrisna que pedem contribuições - cabeças raspadas e longas túnicas alaranjadas -, ou ler notícias sobre gurus indianos que doutrinam nos Estados Unidos ou na Europa. Mas se o internacionalismo do hinduísmo é recente, uma outra religião nascida na Índia, o budismo, espalhou-se pelo mundo oriental - hoje também pelo ocidental -, sem respeitar barreiras étnicas ou políticas, adotado, aliás, como religião de estado por reis não indianos. Sorte parecida teve o cristianismo surgido numa pequena região periférica do império romano que, perseguido no início, aos poucos se impôs como religião oficial desse império e, quando de sua queda, tornou-se a religião dos invasores, preponderante no Ocidente, inserindo-se como elemento caracterísitco de sua civilização. Outra religião, o islamismo, teve também uma trajetória semelhante: nascida na Arábia, religião dirigida aos árabes, aos poucos se consolidou entre povos diferentes e hoje serve também para ressaltar as diferenças culturais e raciais de muitos negros americanos que reivindicam sua identidade no mundo dominado pelos brancos. O aparecimento dessas que se convencionou chamar de religiões universais circunscreve-se aproximadamente ao período de um milênio: o budismo surgiu no século VI a.C., o cristianismo no I e o islamismo no VII d.C. O que intriga os historiadores das religiões, e não só eles, é o período do séculoVI a.C. por seu dinamismo e intensidade religiosa que o tornam um período ímpar na história da humanidade. O filósofo alemão Karl Jaspers, na obra Origem e fim da história, propõe a identidade da história universal como história da religião. Idéia sem dúvida válida pelo menos para a história antiga. Mais ainda, sugere que os meados do I milênio antes de Cristo possam ser considerados o que ele chama de ‘tempo axial’, ou seja, época de ruptura, de polêmica radical, de crise salutar, que veio a constituir uma autêntica linha divisória entre o ‘regime’ cultural e religioso destinado a desaparecer e a nova ‘economia’ levada avante pelo verbo magnífico dos profetas: um já destinado a confinar-se a uma época ‘antiga’, a outra pré-figurativa e portadora já da época ‘moderna’. Jaspers chama isso de ‘revolução profética’, de onde brotou uma nova visão de mundo. Lao Tse e Confúcio na China; Buda na Índia; Zaratustra na Pérsia; Isaías, Jeremias em Israel; mais tarde Jesus Cristo na Palestina; e ainda Heráclito, Pitágoras, Empédocles na civilização grega; acrescentamos, último cronologicamente, mas não menos importante, Maomé: os ‘profetas’ aparecem fortemente críticos e até destruidores das velhas tradições religiosas étnico-nacionais e impulsionam novas experiências e ideais. Entra em crise o velho politeísmo que representava a realidade fragmentada e se introduz o Deus único absoluto, transcendente e dominador do universo e da humanidade. O Deus único é o Deus de todos os povos e de todas as pessoas ao mesmo tempo e sem diferenças. François Houtart atribui o surgimento das novas religiões com características completamente diferentes e até opostas às anteriores como conseqüência das novas relações sociais e econômicas que foram desenvolvidas no período e em vários lugares simultaneamente, o que explicaria a contemporaneidade dos movimentos religiosos. Nos meados do I milênio a.C. nasceu uma economia mercantil de caráter internacional, explica Houtart, e a transformação das relações sociais provocou o aparecimento de novos sistemas religiosos. Entre essas transformações, nota-se uma acentuada separação entre o campo e a cidade. O campo continua a sustentar a cidade com seus excedentes; na cidade, fora os artesãos, boa parte da população é formada por não-produtores: grupos de poder (governantes, administradores, guerreiros), mercadores e escravos destinados aos serviços. Nas cidades, a especificidade das atividades políticas e econômicas e as novas normas de vida a elas conjugadas levam evidentemente a uma relação completamente diferente com a natureza, com um desenvolvimento das forças produtivas cuja racionalidade integra o papel ativo do homem, o seu domínio sobre a natureza. Também as relações sociais mudam: já não é mais o parentesco - o clã - a regular mecanismos das relações, mas os grupos diferentes criam laços assentados em mecanismos não-naturais. Neste contexto, as novas formas religiosas expressam a nova visão de mundo que a pessoa adquire ao ser colocada numa nova realidade.

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